Violas de Queluz

Foto: Marcelo Rosa
Acervo: Max Rosa

A famosa Viola de Queluz é hoje em dia um instrumento raro e existem muito poucas peças ainda espalhadas, principalmente pelo interior de Minas Gerais.

A era das Violas de Queluz ocorreu do início do Sec. XIX e meados do Sec XX, principalmente entre as decadas de 1930 e 1940 e leva o nome de Queluz devido a cidade mineira que hoje tem o nome de Conselheiro Lafaiete e eram fabricadas principalmente pelas familias Meirelles e Salgado.

"As violas de Queluz pararam de ser fabricadas por dois motivos. Primeiro porque os descendentes (mais especificamente os netos) dos principais fabricantes já não tinham tanto interesse em continuar com o ofício da fabricação dos instrumentos de forma artesanal. O segundo foi a chegada dos instrumentos de fábrica como Del Vechio e Tranquillo Giannini, que competiam com as violas de Queluz em desigualdade, pois eram feitos em larga escala.

Até o final dos anos 30 ainda eram fabricadas as violas de Queluz pelos filhos dos Meirelles e Salgado, e a partir daí somente os Salgado continuaram a fabricar até os anos 50, em poucas unidades, porque na verdade a oficina Casa Salgado era muito mais uma casa de reforma do que de fabricação propriamente dita." Essa foi a resposta de Max Rosa , quando perguntei a respeito da "extinção" das Violas de Queluz.

Em uma entrevista para o site do NEAD (Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural) Max Rosa, advogado , violeiro e dono de um estimado acervo de Violas de Queluz, fala sobre a importância deste instrumento e de sua preservação:



"Para compreender a importância das violas de Queluz é preciso voltar no tempo e recorrer à memória das Minas Gerais. Esses instrumentos foram produzidos artesanalmente, em oficinas da região da cidade de Queluz de Minas, hoje Conselheiro Lafaiete (MG), desde as primeiras décadas do século 19, até meados do século 20. No auge da popularidade das peças, Queluz chegou a ter 15 oficinas de violas, mas dois fabricantes destacaram-se dentre os artesãos da época: José de Souza Salgado e Benjamin Cândido de Meirelles.

As violas de Queluz ganharam reconhecimento nacional e internacional. A fama também chegou à literatura. Em diversos trechos de Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, Riobaldo menciona a viola: “Queria ouvir uma bela viola de Queluz, e o sapateado de pés dançando”, (pág 463).

A característica que se destaca nas violas de Queluz é a criatividade no trabalho de marchetaria . Executada com extrema perfeição no tampo do instrumento, a inserção de lâminas de madeiras, aplicadas ou não em conjunto, davam formas a setas, sinos, folhas, ramos circulares e outros elementos nascidos da fértil imaginação dos fabricantes.

Nos anos 1940, com o início da produção em série de instrumentos musicais por grandes fábricas, a produção das violas em Queluz entrou em declínio, até sua total extinção, anos mais tarde.

O advogado belorizontino Max Rosa (foto acima), que também é violeiro, possui um acervo de 14 peças de violas de Queluz, que inclui modelos raríssimos fabricados entre o final do século 19 e início do 20. A maior parte já foi recuperada, mas há peças que ainda aguardam a restauração. Dessas, a que chama mais a atenção é a viola conhecida como “Assombração”

Segundo Max, ela é a viola de Queluz mais antiga que se tem notícia em MG. Ganhou o apelido pelo precário estado de conservação em que foi encontrada e pelo perfil de seu antigo dono, que tinha cara de poucos amigos. A “Assombração” foi fabricada por José de Souza Salgado e pertenceu ao violeiro Joaquim Moreira Ribeiro (1874 – 1958). Joaquim foi mestre de folia e se consagrou o melhor violeiro de toda a região de Entre Rios, conforme relatos de moradores da localidade.

Durante o I Seminário Nacional de Viola Caipira, onde a exposição das violas de Queluz também esteve em cartaz, o Boletim NEAD Notícias Agrárias conversou com Max Rosa sobre seu trabalho de pesquisa, recuperação e valorização da cultura centenária mineira.

Boletim NEAD: O que torna a viola de Queluz tão valiosa?
Max Rosa: A viola de Queluz foi a primeira a incorporar um trabalho de marchetaria que depois foi adotado por diversas outras violas do Brasil. Os fabricantes da viola de Queluz eram famílias tradicionais, sendo que algumas delas descendiam de imigrantes portugueses. Aqui elas continuaram com a arte da produção, o que faz o que faz da viola de Queluz uma sucessora da viola portuguesa, só que com a cara totalmente brasileira. O corpo tem o padrão da viola lusitana, mas aqui ela adquiriu uma identidade própria. Tanto que, nessa incorporação, ela ganhou ares de barroco mineiro. Vemos, naquelas violas mais trabalhadas, o retrato puro de uma herança do barroco, especialmente de sua fase mais rebuscada, que foi o rococó. A viola tem um som muito bonito, mas também ganha o status de obra de arte. Se você nem quiser tocá-la, pode deixá-la pendurada na parede da sua casa, só para poder apreciar o instrumento, porque é realmente algo a ser preservado, acima de tudo.

NEAD: Como surgiu seu interesse por esse instrumento?
MR: Sempre gostei de música e tocava violão. Certa vez, uma tia de Itabira me disse que tinha uma viola antiga em sua casa e que gostaria de me mostrar. Era uma viola antiga da fábrica Tranquillo Giannini. Fiquei com a viola emprestada por uns tempos, achei o som maravilhoso, e daí foi surgindo o interesse pelas violas antigas. O violão foi ficando de lado e a viola foi ganhando espaço. Comecei a tocar e estudá-la, e junto com o lado de violeiro veio também a questão do colecionador. Vi que havia poucas pesquisas sobre o instrumento em livros e que a melhor maneira de conhecer a viola de Queluz é rodar pelas estradas de Minas, conhecendo os donos das violas. Quando a gente dá sorte de encontrar uma viola dessas, num lugarzinho bem distante, é uma ótima oportunidade de sentar com a família que a está guardando, para ouvir muita história. Quando há o interesse das duas partes, compro a viola.

NEAD: Então seu acervo foi sendo montado e as informações foram adquiridas a partir desses encontros, uma espécie de pesquisa de campo...
MR: Isso, porque essas pessoas têm informações muito ricas para nos passar. Muitas vezes elas conseguem nos dizer, pela idade do violeiro, a data em que a viola foi adquirida. Há famílias que nos passam até a afinação que o violeiro usava. E a maioria deles tocava em folias de reis das cidades do interior. Então é um modo interessantíssimo da gente formar um acervo cheio de informações porque, para mim, não seria atraente expor somente as violas e tratar de cada modelo sem falar um pouco do violeiro que foi dono dela, da história que ele construiu com esse instrumento. O fabricante já produziu uma obra de arte fazendo um instrumento cuidadosamente trabalhado, mas essa história ainda continua na mão do violeiro que levou essa viola para inúmeros lugares, e fez muita música nela. Tento conseguir, por exemplo, uma fotografia dos violeiros. Boa parte das violas da exposição traz a seu lado a foto do antigo dono, e a maioria deles já faleceu há 50 anos, no mínimo. Apenas após um amadurecimento das idéias e de várias pesquisas sobre o material é que surgiu a idéia da exposição.

NEAD: As violas passam por um processo de restauração para a mostra. Como ele é feito?
MR: As violas de Queluz estavam praticamente extintas. Há algum tempo já não se viam exemplares delas, nem informações disponíveis. Muitas que encontro estão descaracterizadas e em péssimo estado de conservação. Então a preocupação aumenta, porque, além de formar minha coleção, o objetivo principal é aproximar a viola de sua originalidade.

É importante uma pesquisa aprofundada para retomarmos os materiais usados em cada parte do instrumento. Uma curiosidade, por exemplo, é o uso do osso da canela do boi em algumas peças, que são aquelas bolinhas todas que estão no braço do instrumento, adornando o cravelhal. Temos que recompor cada detalhe. A restauração interna, além do acabamento, também vai permitir que a viola seja tocada, então podemos ouvir novamente o som de uma viola de Queluz.

Minhas primeiras violas foram restauradas pelo luthier Vergílio Lima. Com o crescimento do acervo, resolvi fazer o curso de restauração com o próprio Vergílio, e hoje já estou restaurando minha terceira viola. Dependendo do estado do instrumento, gasto em média 120 horas para restaurá-lo. E esse processo é fundamental para as violas, que não são apenas instrumentos sonoros, mas também visuais. Ele ajuda a recuperar, além disso, a história de Minas, uma arte que é um patrimônio do Brasil.

NEAD: E a “Assombração”? Até ela vai ser restaurada?
MR: A “Assombração” é o caso mais crítico, mas já estou começando a repensar, porque tenho recebido solicitações de várias pessoas para não restaurá-la.... O pessoal está gostando demais dela do jeito que ela está... "


www.nead.org.br/boletim/boletim.php?boletim=423&noticia=1988


Em uma recente troca de e-mails, Max Rosa comenta a respeito da Viola "Assombração":

"Assombração era, na época a viola mais antiga que eu tinha notícia, mas há alguns meses atrás consegui uma viola que é ainda mais antiga. Pena que ela foi encontrada já toda consumida por cupim, e não tem condições de ser restaurada.

Depois disso támbém já tive notícia de outras 2 violas que são deste mesmo fabricante (ainda não identificado) e que foram feitas entre 1860 e 1880, e assim estas 3 violas estão, atualmente entre as mais antigas violas de Queluz existentes."

Fotos: Carolina Fleury
Divulgação: Max Rosa


Assista agora uma matéria feita pela Rede Minas no ateliê de Max Rosa à respeito da restauração das Violas de Queluz, mostrando as técnicas antigas de restaurações nos padrões utilizdos pelos antigos artesões:

5 comentários:

Anônimo disse...

Salve Violeiro, criador de sons e de alegrias...

O link de seu blog já faz parte de nosso conviveo "chamamecero".

...Un saludo muy para un chamigo y guitarrero.

Abrazo che copá.

Anônimo disse...

Olá pessoal do NEAD!
Após ler essa reportagem do violeiro Max, não pude de deixar de compartilhar com vocês um outro violeiro que é também pesquisador e compositor e dono de uma coleção de 104 violas, a maioria de Queluz, confeccionadas em Queluz de Minas, hoje Conselheiro Lafaiete - MG onde moro atualmente e também a maioria com mais de 100 anos. O nome dele é Cláudio Alexandrino e pelo o que acompanho em jornais, revistas e programas de tv, alguns nacionais, ele é a maior autoridade no momento sobre a história das violas de "Queluz" e tantos outros modelos espalhados por Minas Gerais; começou sua coleção em 2001 e desde então trouxe pra mídia a história destas lindas violas que até Dom Pedro descreveu em seu diário quando passou por aqui, ficando extasiado com a beleza e o som que elas emitiam. Suas variadas exposições foram visitadas por mais 8.000 mil pessoas, entre brasileiros e gringos. Em seu acervo, além das violas de "Queluz" contém algumas ferramentas usadas na confecção das mesmas. Fiquei sabendo que está saindo do forno uma publicação que vai contar toda essa estória, com fotos e muito mais que ele escreve junto com sua inseparavel esposa Elisana de Assis e um grande amigo fotografo.
Eu sei que tem vários violeiros por esse nosso mundão, mas esse tem um brilho especial, ele é autêntico e faz tudo de coração, sinto isso.
Tenho esse endereço www.myspace.com/claudioalexandrino e fico maravilhado cada vez que entro, vocês verão alguns programas (Jô Soares e outos) e fotos, lá tem o contato dele se quiserem fazer uma bela reportagem.

Muito obrigado pelo espaço e até breve!

Paulo Cardoso - C. Lafaiete - MG

mica disse...

Oi Max,como vai?tenho em minhas maos uma viola tranquilo gianini,nao tenho dinheiro para reforma-la mas eu acho que é uma uma de queluz,se houver algum interesse de sua parte me mande um email mkf06@hotmail.com
parabens pelo seu belissimo trabaho
abraços marcos f

poxoréu viola disse...

É muito rasto e pouco pasto; é muito chapeu e pouca cabeça; é muita estrela e poca constelação; e muito violeiro mais poucos são cramulhão.

Carlos Vergalim disse...

Poxoréu Viola
Valeu pelo comentario... Só não entendí para quem exatamente foi essa crítica!!! Explique melhor para nós!!! Obrigado por participar...
Vergalim